Cláusula de
inalienabilidade (CI):
O saudoso Orlando Gomes chama com razão essa cláusula de “anacrônica, violenta,
polêmica e antipática”. Trata-se de uma cláusula restritiva que implica também
em impenhorabilidade e incomunicabilidade, ou seja, se o testador deixar seus
bens com essa cláusula, tais bens não poderão ser vendidos ou doados pelo
herdeiro (inalienáveis), não poderão ser tomados pelo credor do herdeiro
(impenhoráveis), e nem se transmitirão ao cônjuge do herdeiro (incomunicabilidade,
1.911).
Conceito: é um meio de gravar o próprio bem em relação a terceiro beneficiário,
que não poderá dispor dele, gratuita ou onerosamente, recebendo-o apenas para
usá-lo e fruí-lo.
A CI não pode ser imposta aos bens do testador, pois não
podemos gravar os nossos próprios bens, mas apenas os bens que transferimos a
terceiros por doação ou herança. A CI não é obrigatória, mas uma vez presente
no testamento a propriedade sobre os bens herdados ou legados fica limitada. A
CI dura no máximo uma geração, então não atinge os filhos do herdeiro. O
herdeiro ou legatário poderá usar, alugar e emprestar estes bens, mas não
poderá vendê-los, ou seja, tais bens ficarão fora do comércio.
Sub-rogação: excepcionalmente o juiz pode autorizar a
venda, mas o produto da alienação continuará gravado (§ 2º do 1.848 e pú do
1.911). Assim trocada a coisa, o novo bem fica sub-rogado na inalienabilidade
imposta pelo extinto. O art. 1.109 do CPC dá muito poder ao juiz, mas é preciso
usar essa força com razoabilidade.
Pode a CI incidir sobre os bens da legítima (1.846), mas
exige justa causa (1.848), cabendo os herdeiros questionar judicialmente a
“justiça” dessa causa, afinal o falecido pode estar apenas atrapalhando a vida
de filhos que não pôde excluir da herança. A causa deve ser clara e objetiva
(ex: filho perdulário, toxicômano), não se admitindo: “deixo uma casa para meu
filho com a CI pois não gosto da esposa dele...”
A CI precisa estar inscrita no Cartório de Imóveis para ter eficácia plena e ser
de conhecimento público. Se os bens herdados forem móveis (ex: uma jóia), a CI
é inoperante, pois os bens móveis, salvo os veículos, não se sujeitam a um
registro organizado como os bens imóveis.
Fundamento: por que se justifica a CI?
1 – para respeitar
a vontade do falecido, que é um dos princípios do Direito das Sucessões.
2 - para se criar
um ônus real sobre o bem herdado, protegendo herdeiros inexperientes e pródigos
contra credores espertos ou um casamento ruim (1.848).
Críticas: por que se condena a
CI?
1 – porque
prejudica o credor do herdeiro. O credor do falecido não se prejudica, afinal
ninguém pode gravar seus próprios bens com a CI. Já o credor do herdeiro fica
frustrado, pois o herdeiro não tinha bens para pagar sua dívida, e agora não
pagará com os bens que recebeu do pai face à impenhorabilidade, causando
insegurança jurídica.
2 – premia um
herdeiro incompetente, desorganizado, tolo, incapaz de cuidar de seus próprios
negócios.
3 – limita a circulação
de riquezas, viola a lei fundamental da economia política, por retirar um
bem do comércio.
4 – prejudica o
genro ou nora do hereditando, qualquer que seja o regime de bens do herdeiro,
face à incomunicabilidade decorrente da inalienabilidade.
Espécies de inalienabilidade:
1) absoluta (em
nenhuma hipótese o testador admite a venda) ou relativa (o
extinto admite vender em alguns casos, a certas pessoas ou em certas condições
previstas pelo mesmo, ex: pode vender a João, mas não pode a José; pode vender
por motivo de saúde, etc.);
2) total (estende-se
a todos os bens do testador) ou parcial (apenas sobre parte
dos bens do hereditando);
3) temporária (ex:
durante dez anos, até o herdeiro fazer 50 anos, etc.) ou vitalícia (prazo
máximo de uma geração).
Observações:
- o bem gravado
com a CI não se sujeita a usucapião por terceiros para evitar fraudes;
- a CI não impede
a penhora do bem gravado por dívidas de tributos do próprio bem, assim pague o
IPTU senão o governo toma!
Nenhum comentário:
Postar um comentário